Por Caroline Fonseca Zandoná Krieger

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Os recém-universitários brasileiros têm muita dificuldade para escrever uma redação com coerência e clareza. Situação preocupante já que muitos deles estão no curso de Direito.

“Nos cursos de direito, o aluno, ao contrário do que o senso comum pensa, não passa cinco anos “decorando” leis e códigos, pelo contrário, ele tem que entender e saber encontrar as leis de que precisa para estudar e que necessitará no seu futuro profissional. No momento em que ingressa no curso ele não só estudará leis, mas todo um conjunto de matérias que envolvem a área jurídica e que o aluno precisa entender, contextualizar e interpretar de forma clara e adequada para assim também de expressar”. (NETO, 2005, p. 22)

É neste momento que o acadêmico do curso de Direito percebe sua deficiência ao não conseguir entender o que lê, ao expressar-se muito mal e escrever sem os padrões básicos da norma culta, com coesão e coerência.

Conforme expõe o desembargador federal e professor de Direito da PUC-PR, Vladimir Passos de Freitas:

“Não é raro que o professor encontre parágrafos incompreensíveis, petições que repetem a mesma coisa duas ou três vezes, ou referências que nada tem a ver com o assunto tratado, porque foram copiadas por quem não consegue escrever. Há uma mescla de mal português com dificuldade de organizar as ideias”. (FREITAS, 2012)

Gonçalves (1997, p.03) diz que “O Direito é, por excelência, a ciência da palavra, como devem tratá-la aqueles que fazem dela seu instrumento de trabalho?”

Para o advogado, capacidade de falar e escrever devem ser plenos, porém, a realidade, o que se percebe no cotidiano das universidades e fóruns é diferente. Certo é que o profissional que não sabe escrever corretamente não saberá se expressar. Ficará limitado à simples cópia de argumentos e petições. A Língua Portuguesa é um instrumento eficaz, necessário e fundamental na atividade dos advogados e de todos os operadores da área jurídica.

Luciano Correia da Silva, em seu livro Português Forense (1991, p.35) diz:

“(…) Nossas faculdades, matriculando alunos com nota final abaixo de cinco, passaram a formar profissionais nem sempre preparados para o exercício competente de seu mister” (…), (…) “nossas Faculdades de Direito dão à luz, com exceções, uma parcela de bacharéis despreparados para o exercício da advocacia” (…), “Não vamos incorrer em erro de generalização, mas é certo que o percentual dos escapos à mediocridade se revela sempre baixíssimo”. (SILVA, 1991, p.35)

Ainda acrescenta:

“A proliferação de escolas inviáveis e o defeituoso processo seletivo aprofundaram a pobreza de redação e de dicção de nossos bacharéis. Na prática forense, inúmeros são os casos de petições e razões ineptas, a ponto de preocupar a Ordem dos Advogados do Brasil. Nos concursos públicos, o item de maior reprovação é o Português: os candidatos conhecem as respostas, porém não sabem expressar-se”. (SILVA, 1991, p.35)

Para Gonçalves (1997, p.13) “O Direito é a profissão da palavra e ao jurista, mais do que qualquer outro profissional, cumpre utilizar corretamente a Língua Portuguesa. Para o jurista e para o advogado, a palavra é o seu “cartão de visitas”

Todas as profissões possuem seu vocabulário especial. Até chegar ao domínio efetivo das palavras da área profissional, é necessário um processo metódico de aquisição anterior, já que o acervo normal mostra-se insuficiente.

Xavier (1999) explica que a fórmula para o domínio efetivo da linguagem está baseada em três situações: conversação, leitura e redação.

A conversação é uma situação que ocorre de forma natural e espontânea, que efetuada em meio aos profissionais competentes da área de formação almejada, será incorporado novas palavras ao seu vocabulário. (XAVIER, 1999)

A leitura é essencial e fundamental para aquele que busca uma efetiva aprendizagem da Língua Portuguesa. Aquino e Douglas (2010, p.9) explicam que “o primeiro passo para escrever é ler, e depois, refletir, racionar” e que “antes de escrever, é preciso ler muito”. Ainda expõem que “aprender a escrever e falar é extremamente útil para a carreira, quase indispensável”.

O estudante de Direito não percebe como é grande a relação entre o curso acadêmico e o estudo da Língua Portuguesa, já que esta é uma útil ferramenta no raciocínio jurídico. Aquino e Douglas apud professor Wilney Magno (2010, p. 20), expõem que “O conhecimento que deseja adquirir está apresentado em Língua Portuguesa. É uma afirmação óbvia, mas poucos se dão conta, verdadeiramente, do que significa.”

E será na produção dos textos jurídicos que o acadêmico terá consciência da dimensão, da importância do estudo e do conhecimento da linguagem como realidade ligada à área jurídica. (BITTAR, 2010)

A professora de Língua Portuguesa para terceirizados do Ministério Público Federal, Giulianna Louise Christofoli, expõe que:

“O advogado que não tiver o conhecimento da sua própria língua fica prejudicado na carreira e dá maiores chances para os concorrentes. É muito claro que se não combinarmos advocacia com a língua portuguesa, o advogado não saberá se comunicar oralmente, não saberá interpretar a lei da melhor forma e, principalmente, não saberá elaborar peças, atividade fundamental da advocacia”. (CHRISTOFOLI, 2009)

Salienta-se que o Direito é exercido por meio da comunicação, “pois pressupõe a interação de agentes, a vida em sociedade e a necessidade de regulamentação de condutas num espaço determinado.” (BITTAR, 2010, p. 14)

Direito e linguagem são indissociáveis. Encontrar a forma de harmonizar e desenvolver métodos que possam superar dificuldades e recuperar o tempo perdido no aprendizado e domínio da língua materna é responsabilidade dos atores envolvidos no processo de formação dos profissionais.


* Este texto é parte do artigo
“A língua portuguesa e o direito.
Reflexos no ensino superior de uma aprendizagem defasada”
escrito por Caroline Fonseca Zandoná Krieger.

Fonte: Âmbito Jurídico